Contexto e Desafios
Este site pretende oferecer conteúdos dinâmicos e informados de acordo com as evidências científicas mais recentes, pelo que será regularmente atualizado.
As crianças e jovens constituem uma das áreas prioritárias de intervenção no contexto político europeu. A OMS declarou que a saúde mental das crianças e jovens é uma área-chave para a qual os profissionais e decisores políticos devem dirigir a sua atenção e preocupações. O Pacto Europeu para a Saúde Mental e Bem-Estar apela a que os Estados Membros da União Europeia intervenham em cinco áreas prioritárias, sendo uma das quais a Saúde Mental na Juventude e Educação. O mesmo acontece a nível nacional. O Plano Nacional para a Saúde Mental privilegia um conjunto de estratégias de prevenção e promoção da saúde mental, entre as quais, programas de educação sobre saúde mental na idade escolar, prevenção da violência e do abuso de drogas ou programas de desenvolvimento pessoal e social. O Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil também inclui como uma das principais linhas de atuação o investimento na prevenção das perturbações emocionais e do comportamento.
Estes programas e planos existem porque e apesar de existir um número cada vez maior de crianças e adolescentes que experienciam dificuldades em responder aos desafios desenvolvimentais que enfrentam e que sofrem os efeitos negativos das perturbações mentais. A prevalência das perturbações mentais entre as crianças e adolescentes aumentou nos últimos 20 a 30 anos.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, em todo o mundo, cerca de 20% das crianças e adolescentes sofrem de problemas comportamentais, desenvolvimentais ou emocionais, sendo que 1 em cada 8 apresenta uma perturbação mental. Fazendo a tradução desta prevalência para a sala de aula e assumindo uma sala de aula “média” com 30 alunos, 6 alunos em cada turma apresentarão uma perturbação mental.
Segundo a Academia Americana de Psiquiatria da Infância e da Adolescência e a OMS-Região Europeia, uma em cada cinco crianças apresenta evidência de problemas de saúde mental. Em Portugal, sabemos que entre os 5 e os 14 anos, o maior peso da doença na qualidade de vida se deve às perturbações mentais e comportamentais (22% do total de DALY associados às doenças não transmissíveis).
Os resultados mais recentes do estudo sobre adolescência da Organização Mundial de Saúde, Health Behaviour in School-aged Children, envolvendo 6000 adolescentes portugueses, revelam um preocupante decréscimo global da saúde mental e física dos adolescentes comparativamente com anos anteriores. Portugal surge com a 33.ª pior posição: só 11% dos rapazes e 14% das raparigas de 15 anos dizem que gostam bastante da escola. Existem também sintomas que revelavam mal-estar psicológico, tristeza, stresse e insatisfação
Para além das crianças com um diagnóstico de perturbação mental, existem muitas outras crianças que evidenciam problemas de comportamento embora estejam abaixo dos limites do diagnóstico clínico, mas que apresentam igualmente maior probabilidade de sofrer dificuldades persistentes ao nível da saúde mental, baixo desempenho escolar, salários baixos, gravidez precoce, problemas relacionais, assim como maior probabilidade de se envolverem em comportamentos delinquentes e atividades criminosas no futuro.
As perturbações mentais na infância podem ter níveis elevados de persistência: 25% das crianças com uma perturbação emocional diagnosticável e 43% com uma perturbação do comportamento diagnosticável continuam a apresentar a perturbação ao fim de três anos; os jovens que experienciam ansiedade na infância têm 3,5 vezes mais probabilidade de sofrer de depressão ou perturbações da ansiedade na idade adulta.
Os problemas de saúde mental na infância e na adolescência constituem ainda um dos principais preditores dos problemas de saúde mental na idade adulta: cerca de metade das doenças mentais tiveram início antes dos 14 anos de idade. A maior parte das doenças mentais manifestam-se geralmente antes dos 24 anos de idade. Newman et al. concluíram que 73,8% dos jovens com 21 anos de idade e uma perturbação mental tinham uma história de doença mental no seu desenvolvimento. Offord et al. demonstraram que 61,3% das crianças entre os 8 e os 12 anos com um diagnóstico de perturbação do comportamento tinham tido pelo menos uma de três doenças mentais nos quatro anos anteriores.
A taxa de prevalência elevada da perturbação mental infantil torna os problemas de saúde mental das crianças e adolescentes mais visíveis em diferentes sectores – saúde, educação, justiça e segurança social.
Sabemos que a falta de saúde mental pode aumentar o risco de delinquência, problemas com a justiça, perturbações de abuso de substâncias e gravidez adolescente. Os problemas de saúde mental podem ter efeitos muito prejudiciais no desenvolvimento social, intelectual e emocional das crianças e jovens e, consequentemente, no seu futuro. Em última instância, podem levar à perda de vida. O suicídio é uma das principais causas de morte nos jovens e uma preocupação de saúde pública em muitos países europeus.
Para além destas problemáticas, a prevalência das doenças mentais entre os jovens é preocupante dado o seu potencial impacto no desempenho escolar. Por exemplo, os jovens com perturbação mental estão em risco de apresentarem problemas disciplinares, absentismo, retenção escolar, más notas, abandono escolar e/ou delinquência.
Os problemas de saúde psicológica entre crianças e adolescentes traduzem-se ainda num impacto económico incomensurável. Só na Europa, em 2010, o custo anual das perturbações da infância e adolescência foi de 21,3 biliões de euros.
Esta realidade exige um aumento da capacidade de resposta e o desenvolvimento de novas formas eficazes para servir as necessidades destas crianças e jovens o mais precocemente possível. A Coordenação Nacional para a Saúde Mental – CNSM, com base no documento da Rede Europeia para a Promoção da Saúde Mental e a Prevenção das Perturbações Mentais, definiu como linha privilegiada de prevenção a implementação de programas de educação escolar para a saúde mental, nomeadamente os programas de desenvolvimento de competências pessoais e sociais.
É necessário que as escolas adotem uma abordagem mais compreensiva e holística na qual a promoção da saúde mental opera de modo consistente ao longo do currículo, do ambiente escolar e dos serviços escolares, sendo integrada em programas e estruturas dentro da escola.
A missão das escolas é educar os alunos para se transformarem em cidadãos responsáveis e competentes. Por isso, as escolas asseguram o domínio de capacidades de leitura, escrita, matemática e ciência, tal como promovem uma boa compreensão da história, literatura, arte, línguas estrangeiras e diversas culturas. Contudo, a agenda educativa e a escola bem-sucedida também é aquela que inclui a promoção das competências sociais e emocionais dos jovens, da sua saúde mental enquanto fundamentos da personalidade saudável e do envolvimento cívico.
O bem estar e a saúde mental são condições essenciais para uma aprendizagem bem sucedida e só podem ser desenvolvidas em cooperação com as escolas. Por outro lado, os resultados académicos contribuem para a saúde, em geral, e para a saúde mental, em particular. O bem-estar mental suporta uma aprendizagem bem sucedida e esta também suporta o bem-estar mental. Se as escolas quiserem atingir resultados educacionais positivos, é fundamental que a promoção de uma saúde mental positiva seja uma parte integral do ethos escolar.
Deste modo, promovendo a saúde psicológica e o sucesso educativo, as escolas podem desempenhar um papel positivo e protetor das crianças e adolescentes:
- Criam resiliência, proporcionando às crianças e jovens os recursos internos para lidar com os stressores negativos e ultrapassar desafios e dificuldades. As escolas podem reforçar o “sistema imunitário” das crianças ao criarem ambientes que promovam o bem-estar e ofereçam apoio e orientação;
- Contribuem para o desenvolvimento positivo dos jovens numa variedade de domínios, incluindo aumento da satisfação com a escola e a vida, o envolvimento com a escola e a qualidade de vida;
- Melhoram a regulação emocional, as estratégias de coping e de resolução de problemas; melhoram a empatia e o ajustamento psicológico; diminuem o bullying e a agressão;
- Aumentam o compromisso e o envolvimento com a escola – as crianças investem mais esforço no trabalho escolar e melhoram as suas atitudes face à escola; melhoram o desempenho escolar e diminuem o absentismo;
- Aumentam o bem-estar dos jovens, das suas famílias e comunidades;
- Oferecem oportunidades para a procura de ajuda – as evidências sugerem que é mais provável que as crianças e os adolescentes procurem ajuda quando nas suas escolas existem oportunidade de aconselhamento psicológico, onde impera a confidencialidade e o anonimato;
- Reduzem os problemas de aprendizagem e os problemas disciplinares, o bullying e a violência dentro e fora da escola, os problemas emocionais (como a depressão e a ansiedade), o tabagismo, o abuso de álcool e de substâncias, assim como os comportamentos de risco para a saúde e as experiências sexuais precoces;;
- Favorecem positivamente as perspectivas de futuro no que diz respeito a empregabilidade, produtividade e perspetivas salariais, integração social e relacionamento interpessoal;
- Diminuem o impacto económico da falta de saúde mental. As crianças pouco saudáveis e bem-sucedidas do ponto de vista social e emocional têm menor probabilidade de se tornarem cidadãs ativas e economicamente produtivas enquanto adultas. Investir no bem-estar mental da geração seguinte, em última instância, também se pode traduzir em benefícios e poupanças económicas para os contribuintes;
A escola enfrenta, assim, o grande desafio de, por um lado, lidar com um conjunto de problemas de comportamentos e de saúde (mental e física), e por outro, assumir um papel importante na promoção do bem-estar das crianças e jovens e das suas competências sócio emocionais.
Partilhe